Programa de monitoramento da morbimortalidade por acidentes e violências no estado do Ceará durante e após pandemia por COVID-19.
Data da publicação: 15 de outubro de 2021 Categoria: Sem categoriaPROGRAMA DE MONITORAMENTO DA MORBIMORTALIDADE POR ACIDENTES E VIOLÊNCIAS NO ESTADO DO CEARÁ DURANTE E APÓS PANDEMIA POR COVID-19.
Identificação do Plano de Trabalho
Em casos de crises humanitárias como em pandemias, medidas de saúde pública referentes à quarentenas, fechamentos de escolas e foco no direcionamento de recursos para o atenção de urgência e emergência são fatores que expõem a fragilidade dos sistemas provocando consequências negativas não intencionais para pessoas mais vulneráveis. A ordem social vigente aponta para a violência interpessoal perpetrada contra essas pessoas, e esse agravo deve ser monitorado concomitante a eventos epidêmicos importantes pois suas consequências podem ser irreversíveis (JOHN ET AL, 2020; BRADBURY-JONES; ISHAM, 2020).
No contexto do isolamento social de enfrentamento a COVID-19, as pessoas precisam permanecer em suas residências, que em situações de vulnerabilidade representam locais onde são perpetrados dinâmicas de poder e relacionamentos abusivos, violência física, psicológica e sexual. As restrições de locomoção impedem vias de fuga para essas pessoas, serviços de proteção a vítima ficam com atividades reduzidas ou com acesso limitado, existe uma dificuldade da força policial ser acionada para cumprimento de medidas protetivas, as redes de apoio das vítimas ficam limitadas, dentre outras questões agravantes para o problema da violência (BRADBURY-JONES; ISHAM, 2020).
Além dessas questões, os serviços de saúde ficam sobrecarregados com o atendimento de pessoas infectadas pelo novo coronavírus e existe uma tendência em interrupção de serviços essenciais voltados para a produção do cuidado às pessoas em situação de violência com repercussões sendo apresentadas globalmente (JOHN ET AL, 2020; BRADBURY-JONES; ISHAM, 2020).
Além dos impactos relacionados à violência interpessoal, o isolamento social e as incertezas e constantes notícias sobre a pandemia pela COVID-19 podem afetar diretamente a saúde e bem-estar das pessoas de modo ainda indeterminado. Medo, preocupação, pavor e desespero podem desencadear questões de transtornos de humor, como ansiedade e depressão, ou agravar o problema para as pessoas que já o apresentam (STEIN, 2020).
Essas repercussões psíquicas podem ser ainda mais graves em pessoas com adoecimentos mentais prévios, como pessoas com esquizofrenia e outros transtornos mentais que com o isolamento social, notícias sobre a pandemia e proibição de visitas para pacientes internados podem ter sintomas exacerbados (FATKE ET AL, 2020).
Os fatores supracitados podem refletir diretamente no aumento de lesões autoprovocadas, tentativas de suicídio e outros comportamentos suicidas. Nesse contexto, tem-se como fatores de risco para suicídio: fatores interpessoais como isolamento social, solidão, falta de pertencimento e percepção de oneração, que pode ser maior em pessoas pertencentes ao grupo de risco para COVID-19 pela preocupação com a infecção; exposição à violência interpessoal; acesso a armas de fogo; aumento de problemas de saúde mental como ansiedade e depressão e dificuldade de acesso à promoção do cuidado psicossocial pelo sistema de saúde encharcado e com esforços voltados ao enfrentamento do COVID-19 (MONTEITH ET AL, 2020).
Já em relação aos acidentes, os de transporte terrestre podem diminuir pela redução do fluxo do trânsito nos centros urbanos. No entanto, deve-se dar atenção aos acidentes que podem ocorrer em casa, com crianças, por exemplo, pela suspensão das aulas nas escolas.
As principais lesões não intencionais que ocorrem na infância em casa são: quedas, traumas locais, acidentes com corpos estranhos, acidentes com animais, queimaduras, intoxicação exógena e quase-afogamento. Dentre as ocorrências de acidentes nesse público, 60,7% podem ocorrer em ambiente doméstico em situações típicas sem eventos epidêmicos como o causado pelo novo coronavírus, aumentando a importância de monitorar esses agravos na atual conjuntura (GONÇALVES, 2019).
Nesse sentido, o presente plano de trabalho tem por finalidade abordar a instituição de um programa de monitoramento da morbidade e mortalidade por causas externas (acidentes e violências) durante a pandemia por COVID-19 e após sua resolução para auxiliar na tomada de decisão de órgãos e setores responsáveis e promover o enfrentamento das consequências da pandemia sobre a população do Estado do Ceará em relação a esses agravos.
Apresentação da proposta e objetivos
A proposta tem por objetivo geral monitorar os dados de morbimortalidade por acidentes e violências após o início da epidemia por COVID-19 no Estado do Ceará. Tem-se por finalidade, ainda:
- Analisar o comportamento da morbimortalidade por causas externas antes e após o início da pandemia pelo novo coronavírus no Estado do Ceará.
- Eleger indicadores viáveis a partir dos dados dos sistemas de informação em saúde do Estado.
- Emitir boletins, relatórios e notas técnicas periodicamente para auxílio de tomadas de decisão no Estado, Superintendências Regionais, Áreas Descentralizadas de Saúde, municípios e meio acadêmico.
- Promover a articulação intersetorial para enfrentamento de violências e acidentes durante pandemia por COVID-19 e após sua solução.
Inicialmente, o proposta contará com a formação da equipe do Grupo de Estudos Promoção da Saúde em Populações Vulneráveis destinada a sua execução sob coordenação da Profª Hermelinda Macena com reuniões periódicas por vídeo chamadas e atividades de educação permanente utilizando de metodologias de ensino a distância.
Serão eleitas as fontes de dados referentes a internações hospitalares por causas externas do Sistema de Informações Hospitalares (SIH), notificações de violência interpessoal e autoprovocada do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) e mortalidade por causas externas do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM). Após análise da viabilidade de inclusão das fontes e suas possíveis variáveis, serão elencados os indicadores
Os indicadores elencados serão submetidos a análise de tendência temporal com procedimento de regressão Joinpoint (ponto de inflexão) de Poisson através do Joinpoint Regression Program versão 4.4.2 (http://surveillance.cancer.gov/joinpoint/). A técnica em questão permite o ajuste de uma série de linhas e seus pontos de inflexão em um teste de tendências anuais. Para cada segmento analisado será obtido o ajuste baseado na sua melhor linha através da utilização do método de permutação de Monte Carlo como teste de significância. Nesse sentido, serão testadas a variação percentual anual (annual percentual change – APC) e a variação percentual anual média (average annual percentual change – AAPC), com intervalos de confiança de 95%. Dessa forma, será possível estabelecer ao longo das séries históricas analisadas a tendência de crescimento (valores de APC positivos), redução (valores de APC negativos) ou manutenção (valor de APC igual a zero).
Os resultados das análises serão apresentados a partir da elaboração de boletins epidemiológicos, relatórios, notas técnicas, artigos acadêmicos e webpalestras. Essa devolutiva terá como prioridade os órgãos e setores do estado responsáveis pela prevenção, vigilância e controle dos acidentes e violências, seu enfrentamento e promoção da cultura de paz com a finalidade de subsidiar tomadas de decisão por parte dos gestores.
Serão priorizados os dados disponíveis no DATASUS para que as atividades possam dar início o mais cedo possível. Para os casos de variáveis indisponíveis para consulta pública ou publicados em tempo não oportuno para o monitoramento dos agravos, a proposta será submetida ao comitê de ética em pesquisa da Universidade Federal do Ceará e da Secretaria de Saúde do Estado do Ceará com a finalidade de obter parecer favorável ao estudo, fornecimento dos dados por parte dos órgãos responsáveis, assinatura de termo de fiel depositário e demais procedimentos éticos necessários. Serão respeitados os princípios bioéticos contidos na Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde.